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Pedro acordou nessa quinta feira! Era o último dia da semana de “fatos”, reuniões fora, visitas aqui, visitas acolá… "Graças a Deus, amanhã é sexta, camisa, jeans e sapatos de vela!..." - Pensou.
De qualquer forma aquele ainda era dia de fato, a camisa… Decidiu que levava a branca, apetecia-lhe pôr a gravata laranja, o fato cinza… E a coisa estava composta!

Entrou no banho, depois de dez intermináveis minutos de um zumbido “chato” para parecer aquilo que na realidade não acontece, não há homens sem pelo na cara, porque é que se tem de tirar todos so dias!? Enquanto tomava banho, lembrou-se da obra prima que o criador lhe pôs no caminho no sábado… Sim foi no sábado na inauguração do tal bar! De repente lembrou-se: “Claro é o gajo que estava com ela! É ele… Mas pareciam namorados e o gajo tem um ar estranho!? ”.

Depois do banho matinal. Depois do creme da cara, do creme after shave, do desodorizante, da água de colónia, da escova de dentes – tinha-se esquecido de lavar os dentes - do creme para a cara, outra vez, de mais after shave e de mais colónia apressou-se a vestir, a roupa estava escolhida. Era fácil pôr tudo rapidamente! Mas aquela ligação. A Obra prima do criador e o, agora conhecido, meio estranho, não saíam da cabeça!

O telemóvel deu sinal de mensagem. Pedro parou de vestir para averiguar da importância da mensagem. Verificou que o número do emissor não estava na sua agenda. Abriu e leu: “Tenho saudades tuas. Não sei nada de ti. Continuo a amar-te.”.

- Que porra é esta? Só pode ser: Áurea! Fogo! Outra vez não! Pensei que já tinha acabado!

Pedro decidiu ignorar aquela mensagem, como no passado, menos recente, tinha ignorado todas as outras mensagens de Áurea.

Áurea tinha sido uma ex-namorada de Pedro, na realidade a última ex-namorada, de quem ele a muito custo se tinha visto livre. Tinha sido difícil, ela fazia por aparecer, por se insinuar, por estar presente, inclusive com os seus amigos, tinha tentado uma aproximação a Joana, a João, a Bruno, a Maria, mas ninguém lhe tinha dado muita importância, na realidade João achava Áurea meia louca, tresloucada mesmo! Joana achava que era parvinha, foi para todos um grande alívio quando aquela relação acabou! Alivio principalmente para Pedro.

Continuava a vestir-se e quando pegava na gravata laranja lembrou-se: “Esta foi ela! Fogo que azar, já não punha a gravata há um tempo e hoje que decidi, vem com mensagem…”. Decidiu trocar a gravata, por uma azul, comprada por si! Não haveria perigo de ter mais mensagens indesejadas por causa de peças roupa. Continuou, pensando e a sorrir do ridículo que é acreditar nestas coisas, claro que não acreditava naquilo, mas que parecia obra de bruxaria parecia. Há mais de um mês que não sabia nada desta Áurea, há mais de uma mês que não tocava na gravata laranja, logo naquele dia!?

Saiu para o escritório, ainda a pensar na vida, lembrou-se mais uma vez da obra prima que o criador lhe tinha posto no caminho! Tinha uma aparência casta, pura, amiga do seu amigo! E o outro… o que lhe aparecia sempre à frente! Era estranho... Mas que raio de ligação havia.

Chegou ao escritório, depois do habituais cumprimentos, cafés, apanhar correspondência e demais hábitos de quem trabalha, sentou-se à secretaria. Já com o computador aberto e a ver a sua correspondência desta vez electrónica foi reparando nos emails que entravam! Quando olhou com mais atenção reparou que já ia em doze, mas a avançar, para treze, catorze, quinze… Parou nos trinta e três…

Havia trabalho! Assim que abriu a pasta de entradas verificou que dos trinta e três novos emails vinte e sete eram de Áurea.

Pedro teve um acesso de fúria, aquilo não lhe estava a acontecer! Um acesso de fúria acalmado com bom senso!... Bom senso para ignorar e fazer de conta que nada se passava!

Vinte e sete emails, uma mensagem! Uma não. Reparava agora que já ia em sete. Sete mensagens escritas. Tudo de uma ex-namorada de quem não sabia nada há pelo menos 40 dias, eram exactamente 40 dias tantos quantos o jejum de Cristo no deserto. Aquilo era o seu jejum de Áurea. Jejum da ex-namorada mais chata da história de Pedro e possivelmente da história de toda a humanidade!

O dia seguiu, entre mensagens, ao todo mais dezasseis, portanto num total de vinte e três… vinte e três mensagens entre as nove da manhã e as seis e meia da tarde, é obra! É não ter mais nada que fazer. Pedro quis acreditar que aquilo foi aquele dia! Só naquele dia! O dia em que decidiu pôr a maldita gravata laranja. O dia em que decidiu deitar a gravata laranja para a incineração! Sim, só incinerada!

Mas foi um dia positivo. Teve ainda tempo para trabalhar! Lançar algumas questões pertinentes sobre um novo projecto privado, que no seu entender não era uma mais valia para o público. Por isto ser alvo de alguns elogios, quer de colegas quer de directores e também algumas caras feias, principalmente dos promotores da “obra”!

O dia de trabalho chegou ao fim! Esperava-o um jantar no “Senhor Francisco” com Bruno e Pedro! Áurea, a grande chata estava com certeza na ordem do dia!

No caminho de casa, Pedro contou, pelo telefone, a João esta aventura do dia… João, como habitualmente, gozou… Mostrando o quanto Áurea não o enganou! Ela sempre lhe pareceu louca! Muito maluca… Nada dessa maluqueira saudável! Maluca mesmo. Louca!

Já em casa Pedro repousou de um dia intenso num banho de imersão pouco aconselhável para o nosso planeta, mas merecia e precisava!

Enquanto deambulava nos seus mais profundos pensamentos… e no mais profundo silencio… sentiu uns pequenos toques na madeira! Uns pequenos toques distantes… que de repente desapareciam… E o silêncio voltava a ser o senhor do espaço! O senhor do ar. Mas mais toques se ouviam… desta vez misturados com gemidos! Vinham da porta! Da porta da rua…

Pedro saiu do banho… Dirigiu-se para a porta da rua, quando se preparava para abrir reparou na sua nudez, três passos para trás e apanhou o robe de banho!

Continuava a ouvir, toques, pequenos toques na porta! Voltou a aproximar-se desta e abriu a medo… e:

- Um cão???

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